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  • Ana Julia Silveira

O gênero ‘True Crime’ na era do streaming

A crescente atração por narrativas sombrias e o desafio ético de contá-las


Repórter: Ana Julia Silveira

Editor: Larissa Mafra


Representação de uma cena de crime. Foto: Freepik

Em 2024, a história do "Maníaco do Parque" está prestes a ressurgir nas mídias, não mais nos jornais, mas nas telas de streaming do Prime Video. Esta é apenas mais uma adição à tendência de produções que parecem imunes à passagem do tempo: o gênero "true crime". Desde histórias sobre assassinatos na Idade Média até os dias atuais, narrativas reais de crimes têm mantido um certo fascínio sobre o público.


De acordo com dados do Spotify, uma das principais plataformas de streaming de áudio, o podcast "Modus Operandi" alcançou mais de 14 milhões de reproduções em 2021. Atualmente, ocupa a 11ª posição entre os podcasts mais ouvidos no Brasil, sendo o primeiro na categoria de crimes reais.


Bernardo Brum, doutor em comunicação e crítico de cinema, destaca que, embora a curiosidade sobre o assunto sempre tenha existido, os podcasts reacenderam esse interesse. Ele acredita que as produções em formato de áudio oferecem uma experiência única, e superam as possíveis censuras associadas à exibição desse conteúdo na televisão ou no cinema. Brum argumenta que as pessoas se sentem mais à vontade para consumir temas sensíveis e se aprofundar no assunto em um ambiente mais privado, facilitado pelo uso de fones de ouvido. De acordo com o crítico, "A materialidade do podcast nos leva a nível superior de tolerância".


Chico Felitti, jornalista e criador dos podcasts "A mulher da casa abandonada" e "O ateliê", destaca a mudança significativa na forma como as histórias de crime são contadas ao longo do tempo. "Se antes o que fazia muito sucesso era o sensacionalismo, acredito que hoje em dia as histórias que mais chamam a atenção são aquelas que ilustram um caráter mais profundo", afirma. Segundo ele, o interesse do público existe quando um crime reflete toda uma sociedade.


Um exemplo claro dessa tendência é o retorno do programa "Linha Direta", que fez sucesso nos anos 90 e recentemente voltou em um novo formato. Agora, além de apresentar casos, o programa inclui diálogos com especialistas e entrevistas com amigos e parentes das vítimas.

Quadro simulando mesa de detetive. Foto: Freepik

A ética na produção


À medida que o gênero “True Crime” continua a crescer em vários formatos, de podcasts a séries de streaming, muitas questões éticas sobre a produção dessas histórias e seu impacto na sociedade têm surgido. Chico Felitti enfatiza a importância de considerar a relevância pública do assunto. Ele afirma: "O limite da cobertura de crime, para mim, está na relevância pública do tema. É muito diferente de noticiar um crime apenas pela curiosidade que ele possa despertar. Isso não me interessa".


Itanielly Macedo, perita criminal e consumidora de conteúdo "true crime", compartilha sua perspectiva. Ela ressalta que as obras desse gênero frequentemente exploram as motivações por trás dos crimes, sem necessariamente justificar ou romantizar as ações dos criminosos. "Mostrar os porquês de uma pessoa cometer um crime não significa defender, é apenas um apontamento".


Macedo também destaca que a sociedade muitas vezes não está preparada para lidar com certos tipos de informações, o que pode ser um problema. No entanto, ela argumenta que, em geral, criar espaço para discussão e reflexão sobre temas complexos pode gerar mais benefícios do que malefícios.


Bernardo Brum explica que contar essas histórias é um desafio complexo e salienta a necessidade de ser claro sobre as intenções ao abordá-las. Brum provoca: "Existe maneira ética de representar um crime? O criador precisa deixar claro a sua intenção. É um objeto muito complexo”.


Brum também aponta a importância de evitar abordagens espetaculares e glamorosas ao contar histórias de crimes reais. Ele ressalta que, historicamente, as pessoas sempre se interessaram por essas narrativas, mas o desafio está em encontrar maneiras éticas de representá-las. "É algo que precisamos buscar, mesmo que nunca alcancemos completamente a ética na representação dos crimes.”

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