Temporada de 2023 conta com 20 treinadores demitidos em 26 rodadas
Repórter: Ana Beatriz Dias
Editor: Bernardo Monteiro
O Brasileirão 2023 se destacou por um motivo controverso já em sua rodada de abertura, a alta rotatividade de treinadores. A estreia do campeonato quebrou o recorde das edições anteriores com as demissões de António Oliveira, Fernando Lázaro e Rogério Ceni. Essa constante troca de comando técnico reflete a intensa pressão por resultados imediatos e os desafios econômicos enfrentados pelos clubes brasileiros.
O Brasil, país mais rico do futebol sul-americano, é internacionalmente conhecido pelas demissões de treinadores. As fortes pressões dos dirigentes, dos elencos e também das torcidas por bons e rápidos resultados levam os técnicos a serem expostos. Se um time apresentar uma má campanha, ele perderá bilheteria e interesse das marcas. Para evitar o agravamento desses fatores, as diretorias optam pelas saídas dos comandantes das equipes, já que eles são os principais alvos de críticas dentro dos clubes.
Um aspecto negativo da demissão dos treinadores é a multa rescisória que os times precisam pagar. Em média, os contratos são de uma temporada. Se o técnico for dispensado em um tempo inferior ao que foi acordado, ele terá direito a receber o valor da multa. É o caso do Flamengo, que, só em 2023, gastou R$ 24,5 milhões com as demissões de Vítor Pereira e Jorge Sampaoli. Outro exemplo é o do líder Botafogo, que terá que desembolsar R$ 4,5 milhões ao português Bruno Lage e a sua comissão pela rescisão do contrato, que era válido até dezembro de 2023.
Por essas constantes mudanças, cada treinador apresenta uma média de apenas três meses de trabalho. Na temporada atual, somente seis times (de um total de 20) permanecem com os mesmos técnicos. Os cargos dos comandantes brasileiros, comparados às grandes ligas do exterior, duram até quatro vezes menos do que os principais nomes na Europa.
Times e jogadores afetados pela troca de técnicos
Ao longo das 26 rodadas, 20 nomes já foram dispensados. Restando 12 rodadas para o fim, a temporada de 2023 pode superar a edição do ano anterior, que teve 21 demitidos. Como a troca é habitual no Brasil, as diretorias dos clubes estão acostumadas a destituir aqueles que não têm tido bons números. Por exemplo, o uruguaio Diego Aguirre, ex-Santos, ficou apenas cinco jogos no comando do Peixe. Na visão de alguns torcedores, essas mudanças prejudicam os times.
Demis Dias, torcedor do Botafogo, avaliou que a troca dos técnicos é feita sempre de maneira necessária. No entanto, é inegável que essas alterações apresentam riscos aos elencos. “A partir do momento que um novo treinador chega, ele mostra seu trabalho e os jogadores abraçam a ideia. Se o serviço não evoluir, chegará outro com diferentes pensamentos e métodos. O desempenho, entrosamento e o futuro deles são afetados. Quando um profissional assume determinada equipe, automaticamente ele impõe o método dele, ou seja, o modo de jogar vai ser diferente.”
Foi justamente o caso do alvinegro carioca, que viu a vantagem para os rivais diminuir e trocou de comandante, mesmo estando na ponta da tabela. Segundo Dias, a atitude tomada foi correta. “Apesar de fugir da lógica, pelo fato de ser líder, o time já estava sofrendo com as mudanças do último treinador, porque ele já havia feito transformações no tático. Se não mudasse agora, seria pior lá na frente.”
Para evitar a chegada de mais um técnico, a diretoria decidiu manter o interino Lúcio Flávio até a reta final. Na opinião do torcedor, a decisão foi a melhor a ser tomada. “Ele já foi nosso camisa 10. Tem respeito pelo clube, conhece e sabe bem o que precisamos. Faltam poucos jogos. O trabalho do Lúcio, junto ao do Carli (auxiliar), é mais seguro, porque o projeto já está pronto. Ninguém mais vai vir para querer mudar.”
Problemas que estrangeiros enfrentam no Brasileirão
Em 2023, o campeonato alcançou a marca de 17 treinadores estrangeiros. Até a 19ª rodada, o número caiu para 13. Indo para a 26ª, restam oito. Por essa queda, nota-se que os “gringos” encontram dificuldades no Brasil. Junior Oliveira, torcedor do Santos, argumentou que os principais obstáculos que eles enfrentam no país são: adaptação do calendário, alta cobrança da torcida e da imprensa, distância familiar e deslocamento geográfico (mais distante do que na Europa).
Oliveira citou dois técnicos que já esclareceram esses problemas: Jorge Jesus (ex-Flamengo) e Juan Pablo Vojvoda (Fortaleza). “O Jesus foi multicampeão em 2019/2020 e ainda assim saiu do time. Em um momento de pandemia, ele precisou escolher entre o clube e a família (mulher e filhos). É difícil de se adaptar, por ser uma mudança entre dois continentes, muitos vêm sozinhos. Os técnicos europeus sentem bastante aqui, fora a pressão que colocamos em cima deles.”
O segundo exemplo é o de Vojvoda, finalista da Copa Sul-Americana que recentemente falou sobre as questões do futebol brasileiro. “Ele deu uma entrevista e citou o calendário ‘apertado’ entre um jogo e outro. Além disso, comentou da posição do clube no mapa. Por estar mais distante que os demais times do campeonato, o Fortaleza enfrenta viagens longas. Isso desgasta o elenco, não é só o físico, mas também o mental dos jogadores. Pelo fato de aqui ser mais competitivo, muitos não conseguem responder às expectativas.”
Limites de trocas de treinadores por temporada
Desde 2006, quando o campeonato começou a ser disputado por 20 equipes, a edição de 2015 é a que detém o recorde de demissões. Ao todo, foram 32. O Corinthians, que sagrou-se campeão, foi o único clube que permaneceu com o mesmo técnico ao longo das 38 rodadas. Por outro lado, o Goiás foi o time que mais fez mudanças, com quatro nomes diferentes. Em 2021, a CBF adotou uma regra que limitava as trocas de treinadores, sendo permitido apenas dois por ano. Entretanto, o acordo foi derrubado para as próximas temporadas no ano seguinte.
Para Matheus Tomelin, torcedor do Corinthians, o limite de técnicos faria com que as diretorias tivessem melhores gestões. Tomelin entende que se os clubes estudassem mais os nomes dos treinadores, evitariam a rotatividade e não prejudicariam o elenco. “Seria uma boa opção, porque é necessário pensar em cada detalhe antes de trazer alguém. Acredito que a regulamentação influenciaria também na mudança cultural do Brasil, que tem o costume de dispensar trabalhos de apenas dois, três meses.”
Tomelin analisou a queda de Vanderlei Luxemburgo, que foi contratado em maio e ficou quatro meses no cargo. “Ele foi escolhido pelo nosso presidente de forma equivocada e às pressas, porque o time estava passando por um momento ruim. Na verdade, o que aconteceu foi que ele só atrapalhou a nossa equipe. O Luxa é um treinador com trabalhos recentes ruins, pouco animadores, que ‘de cara’ não resolveriam o que o clube estava precisando. Ele teve um aproveitamento de apenas 48%, deixou a desejar e nós (torcedores), já esperávamos por isso,” disse Matheus.
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