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MST solicita atualização de imposto sobre terra no orçamento de 2024

Atualizado: 22 de nov. de 2023

Na última quarta-feira (18), o movimento se reuniu com as autoridades federais para discutir o financiamento da reforma agrária


Repórter: Beatriz Serejo

Editor: Eduardo Dias


Reunião com representantes do MST em Brasília - Foto: Divulgação/MST

O Movimento Sem Terra (MST) cobrou novas medidas para garantir o financiamento da reforma agrária. Um dos principais pontos abordados pelo movimento foi a atualização da cobrança do Imposto Territorial Rural (ITR). Ele incide sobre as propriedades rurais de acordo com a produtividade, de maneira que a taxação sobre terras improdutivas ou inutilizadas seja maior. Entretanto, os critérios que avaliam a produtividade de um terreno foram formulados em 1975 e não condizem mais com os números de 2023.


O ITR é pago pelo proprietário de uma área rural, pelo titular ou pelo possuidor de um título. Esse imposto varia de acordo com o tamanho do terreno e do grau de utilização. Quanto maior a terra, maior o valor. O contrário ocorre em relação à produtividade: quanto mais utilizada para atividades pecuárias ou de plantio, menor o valor a ser pago. Terras sob proteção ambiental, cobertas por florestas ou inferiores a 30 hectares são isentas do ITR. Todo terreno deve ser declarado anualmente à Receita Federal, ainda que seja isento do tributo.


O governo federal sinalizou que as pautas da reforma serão incluídas no orçamento de 2024. O MST por sua vez, solicitou que os valores fossem repassados ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para garantir a promessa.


Imposto pode ajudar a reforma agrária, mas ainda é ineficaz


O ITR gera pouca arrecadação para o governo desde a promulgação da Lei 9.393/1996, que desonerou o patrimônio rural e favoreceu o latifúndio improdutivo. Além disso, ela reduziu a progressividade do tempo, com isso, a alíquota caiu de 36% para 20% por mais quatro anos. Segundo a Receita Federal, no ano de 2023 foram recebidas cerca de 5,8 milhões de declarações do ITR, valor considerado baixo se comparado à quantidade de terras a serem declaradas no Brasil.


Fátima Gonçalez, economista pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), afirma que a tributação justa nas áreas rurais é a porta de entrada para o início da democratização do acesso à terra, e uma forma de reparação histórica. “O ITR pode reduzir a concentração fundiária, mas ele precisaria ser uma prioridade entre as principais tributações para poder fazer alguma diferença. Esse imposto era para ser um instrumento fiscal para garantir a função social da terra, ser produtiva economicamente, mas ele não é uma prioridade no país, então não é cobrado da forma como deveria”.


A especialista também destaca que, hoje, a principal dificuldade para a arrecadação do ITR são as falhas no cálculo do tributo. O levantamento do valor é realizado por meio do Documento de Informação e Apuração do ITR (DIAT), que extrai a informação sobre o Valor da Terra Nua (VTN), que representa o valor das terras não utilizadas de uma propriedade. O imposto incide somente sobre o VTN, mas não existe uma metodologia definida por lei que calcule este preço. A ausência de legislação resulta em valores de terra muito abaixo do mercado, o que gera, consequentemente, baixa arrecadação do ITR.


Fátima citou alguns benefícios que uma maior arrecadação pode trazer para os municípios do país. “Este imposto estimula a produção, até porque o proprietário está pagando caro para produzir algo, então aumenta o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) pela prefeitura. Isso garante a melhor utilização dos terrenos rurais, melhora a economia e circulação de produtos rurais, diminui a concentração fundiária e a desigualdade, mas isso não é uma urgência para as autoridades”.


Imagem representativa do movimento sem terra, 2016 - Foto: Agência Brasil

Dificuldades do diálogo entre o MST e o poder federal


O primeiro desafio é a articulação entre o governo federal e as instituições da reforma agrária. Na reunião da última quarta-feira, o movimento debateu a dificuldade de comunicação entre o Incra e a Receita Federal. O Incra é uma autarquia criada na década de 1970 com o objetivo de promover a ocupação de terras ociosas e improdutivas, principalmente na região Amazônica.


Por meio de processos de regularização fundiária, o órgão é responsável por fiscalizar a produtividade da terra, enquanto a Receita deveria cobrar os impostos sobre essas propriedades. Porém, eles não compartilham suas bases de dados entre si, o que prejudica a aplicação do ITR. Ainda em relação às terras, representantes do MST, na reunião, discutiram formas para desburocratizar o acesso aos terrenos para a reforma, além da expropriação de terras para quitação de dívidas.


William Castro, formado em direito pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e especialista em meio ambiente, afirmou que a burocracia por trás da reforma agrária diz respeito a uma estrutura legislativa antiga e ao descaso federal com a desconcentração fundiária . “A lei é antiga mas possui brechas, e é por meio delas que o MST tenta trabalhar para promover a reforma. Uma das maneiras que eles podem mexer com uma terra é por meio da expropriação, que priva o dono de algo que o pertence, como um terra improdutiva, mas isso só pode acontecer se houveram provas de cultura ilegal ou exploração de mão-de-obra escrava”.


Entretanto, o advogado explicou que essa tentativa de desburocratizar a reforma vai de encontro a um dos princípios fundamentais do ser, o direito à propriedade. “É complicado porque a expropriação, por exemplo, é vista como um decreto absurdo, já que não seria legítimo tomar uma terra de quem não quer vendê-la com um propósito de uso social, por mais que uma terra seja improdutiva, na lei, isso não é ilegal”.


O Incra esclareceu que as desapropriações ocorrem quando o latifúndio é avaliado como improdutivo após comprovações de que a terra não é explorada adequadamente. Segundo o Instituto, o Brasil tem mais de 228 milhões de hectares improdutivos. Além disso, existem mais de 729 pessoas no Brasil que se declaram proprietárias de imóveis rurais, com dívidas acima de R$50 milhões com a União cada. No total, esse grupo deve mais de R$200 bilhões e suas propriedades são suficientes para assentar 214.827 famílias, mais que o dobro do número que espera a reforma agrária.


O MST ainda enfrenta desafios orçamentários com demandas para o assentamento de 50 mil famílias, ampliação do crédito para os assentados, infraestrutura e outros financiamentos para órgãos públicos e programas sociais ligados à reforma. O orçamento de 2023 ainda está sujeito ao teto de gastos, aprovado no Governo Temer para limitar os gastos públicos.


O projeto da Lei Orçamentária Anual (LOA) para 2024 prioriza a saúde, a educação e a habitação. O texto prevê R$2,093 trilhões em despesas e déficit fiscal zero. Há uma estimativa de aumento de R$129 bilhões em gastos neste ano. Na reunião, o movimento foi informado pelo governo que este novo arcabouço fiscal iria facilitar o remanejamento de verbas para a reforma agrária.


A economista Fátima Gonçalez afirma que, no momento, a maior dificuldade que o MST enfrenta é a espera por um espaço no orçamento do ano que vem. “O movimento precisaria de no mínimo 500 mil reais para assentar as famílias que esperam esta mudança, e ainda o financiamento necessário pelos órgãos da reforma como o Incra. Dado o histórico de descaso do governo com as pautas ambientais e latifundiárias, o MST deveria continuar lutando para conseguir um espaço na agenda orçamentária primeiro”.



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