Especialistas apontam que nova lei pode beneficiar microempreendedores brasileiros e facilitar o acesso a empréstimos.
Repórter: Beatriz Serejo
Editor: Bernardo Monteiro
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou o Marco Legal de Garantias de empréstimos, que permite o uso de um mesmo bem, como um imóvel, para garantia de mais de um pedido de empréstimo. Além disso, a medida pretende facilitar a tomada de um bem, melhorar a comunicação ao inadimplente e descomplicar o uso de crédito para fins pessoais ou comerciais. A norma estabelece novas condições para a realização de penhora, hipoteca ou transferência de imóveis para quitação de dívidas, mas foi vetada a tomada de veículos como garantia sem autorização da justiça.
A nova lei permite ao devedor contrair novas dívidas com o mesmo credor, a quem se deve o pagamento da alienação fiduciária, dentro do limite da sobra de garantia da operação inicial. Por exemplo, se um primeiro empréstimo de imóvel for de R$100 mil e a dívida inicial for de R$20 mil, o devedor pode pedir um novo empréstimo junto ao mesmo credor de até R$80 mil, para quitar sua dívida. O Marco Legal ainda cria um agente de garantia, que gerencia os bens do devedor, faz o registro do gravame do bem e tem o poder de atuar em ações judiciais sobre o crédito garantido.
Entretanto, a proposta sancionada não permite o uso do mesmo bem como garantia em diferentes bancos, apenas para a mesma instituição. Existe ainda a ressalva que não possibilita a entrega do único imóvel do devedor como garantia, ou seja, é necessário possuir mais de uma casa ou carro para que o empréstimo valha. Isso prevê que a família não fique desalojada caso deixe de pagar alguma dívida.
O que muda para a economia dos empréstimos e juros?
A nova lei de garantias de empréstimos prioriza, principalmente, facilitar a tomada de um bem, e isso permite a redução do risco da operação, uma vez que o imóvel ou carro se tornam garantias que podem ser tomadas pela justiça em caso de inadimplência. A tendência é que as taxas cobradas pelos bancos sejam baixas para essas operações.
Os juros sobre o valor de um empréstimo são calculados pela percepção de custos e riscos para a instituição financeira credora. Quanto maior o risco de endividamento, falha na comunicação, empecilhos legislativos e em relação ao pagamento, maior serão os juros.
Especialista em direito tributário e mestre em economia e finanças pela FGV, Carlos Bonacelli, afirma que o marco de garantias vai reduzir os juros de empréstimos de maneira geral. “Esta lei aumentou o acesso ao crédito e deu mais possibilidade de oferecer bens em garantia, ou seja, uma pessoa que tenha mais de um bem em seu nome, agora pode pedir um empréstimo sem se preocupar se vai ficar desalojada, por exemplo. O risco dos bancos vai ser muito menor, e a disponibilidade de crédito com juros menores vai aumentar”.
A garantia real e palpável, por meio da alienação fiduciária, transfere o imóvel para o credor até o fim do pagamento, operações assim possuem juros reduzidos, em torno de 15% a 20% ao ano, se comparado aos 91% do crédito pessoal não consignado e aos 440% do rotativo do cartão de crédito. Se torna mais vantajoso este tipo de empréstimo em que o banco possui riscos reduzidos.
O advogado ainda comentou que a lei é uma flexibilização positiva da legislação, que aumenta a liberação de crédito para pessoas, empresas e pessoas jurídicas que tem a possibilidade de dispor de garantias. Bonacelli diz que isso traz uma estrutura regulatória moderna, adequada às transformações da sociedade contemporânea, e que permite uma rápida e eficiente execução das garantias. “A microeconomia favorável contribui também para reduzir o risco de inadimplência e de operações de risco para os bancos, a diminuição de juros de maneira geral é quase sempre positiva”.
O Brasil voltou a ter os maiores juros reais do mundo em novembro, com 6,9% ao ano. A taxa básica de juros, a Selic, está em 12,25% após um corte de 0,5%, ainda que a inflação esteja sendo reduzida na previsão de 2023 feita pela consultoria MoneyYou, em novembro deste ano.
Bonacelli afirmou que em relação ao cenário nacional, o novo marco de garantias indica quadro positivo principalmente para a circulação da economia do empreendedorismo. “O Banco Central elevou as taxas de juro para combater a inflação, isso demonstra controle fiscal. Esta nova lei diminui a incidência dos juros sob os empréstimos, não a nível nacional, o que se torna positivo, principalmente, para o pequeno empreendedor que faz parte da roda de funcionamento da economia brasileira”.
O Marco Legal das Garantias de Empréstimos pode gerar um círculo virtuoso dentro do sistema financeiro, já que o funcionamento de garantias que viabilizem o alcance mais rápido do bem dado traz a percepção de mais segurança na transação, ou menos riscos. Entretanto, segundo o especialista, a lei deixa no ar a preocupação com o endividamento do devedor, que pode substituir dívidas por mais dívidas para não perder seu imóvel.
A nova lei para os empreendedores brasileiros
A medida do Marco Legal beneficia os donos de pequenos e médios negócios na quitação de dívidas, na obtenção de capital de giro e na expansão e investimentos para crescimento da empresa. O acesso a crédito de baixo juros é fundamental para manter os microempreendedores que têm dificuldades de reestruturação e geralmente enfrentam dificuldades para pedir empréstimos devido às rígidas regras de garantias.
O economista e empreendedor, Maurício Novaes, entende que o Marco Legal das Garantias possibilita a rotatividade do mercado de crédito. “O acesso a investimentos e créditos é essencial para as microempresas que precisam crescer, criar franquias ou pagar alguma dívida. A flexibilização das garantias de empréstimos para os empreendedores pode ser uma virada de chave”.
Antes da lei ser sancionada, uma casa só poderia ser dada como garantia em uma única operação de crédito, agora esse mesmo imóvel pode ser usado em mais operações e linhas de crédito, facilitando o acesso a financiamento de pequenos negócios, mas também, a iniciativa abre portas para o endividamento.
Maurício comentou que apesar da nova lei abrir um leque de possibilidades creditórias para pequenos empreendedores, ela também pode prejudicá-los a longo prazo. “Eu já me endividei muito com empréstimos quando estava começando, mas principalmente por causa dos juros cumulativos que dobravam o valor da minha dívida. Esta lei diminui a taxa de juros sobre as operações de empréstimos, mas abre a oportunidade para pessoas se perderem em dívidas”.
Segundo uma pesquisa feita, neste ano, pela revista Endeavor, o maior obstáculo para o empreendedorismo, depois dos impostos, é a gestão financeira. Cerca de 48% dos empreendedores entrevistados afirmam que os custos da empresa estão acima da receita devido ao pagamento de dívidas e a falta de organização orçamentária.
O economista comentou que o Marco Legal das Garantias de Empréstimos indica flexibilização legislativa na burocracia do crédito no país, mas que o caminho para o endividamento pode ser mais fácil. “O uso do mesmo bem para mais de um empréstimo ajuda no investimento de um pequeno negócio ou na expansão dele, mas usar dessa iniciativa para pagar outras dívidas, ou criar mais parcelas, só facilita no endividamento da empresa”.
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