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  • Leonardo Siqueira

Indígenas são minorias em universidades e estudantes relatam: ‘ambiente desafiador e solitário’

Dados indicam que alunos indígenas correspondem a cerca de 0,5% dos universitários no Brasil


Repórter: Leonardo Siqueira

Editor: Bernardo Monteiro


Estudantes no 1º Cinedebate indígena promovido por coletivo da UFF - Foto: Coletivo dos Estudantes Indígenas da UFF

No mês de outubro, Ailton Krenak foi eleito imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL), o primeiro indígena na história a ocupar uma cadeira na academia. Filósofo, poeta e escritor, a trajetória de Ailton Krenak, no entanto, não corresponde à realidade de muitos indígenas no Brasil. No ensino superior, por exemplo, o número de estudantes autodeclarados indígenas aumentou em 374% de 2011 para 2021, mas ainda representava apenas 0,5% do total dos universitários no país, segundo dados do Censo Demográfico de 2022.


Juliana Gomes, aluna de História na Universidade Federal Fluminense (UFF) e uma das fundadoras do Coletivo dos Estudantes Indígenas da Universidade, revela que a faculdade é, muitas vezes, um meio hostil para os estudantes indígenas: “É um ambiente muito racista e solitário. E mesmo para quem pauta a questão racial na faculdade, não costuma compreender a questão indígena. Não é levado em conta o racismo que a gente sofre, nem as diferenças culturais. É um ambiente muito solitário.”


Além da solidão entre os estudantes, para ela há uma escassez de intelectuais, pensadores e autores nas universidades. Isso faz com que a questão indígena seja pouco retratada na universidade, e, quando é, aparece apenas enquanto objeto de estudo, e não como autor da própria história.


Para Kelly Russo, coordenadora do Núcleo de Estudos sobre Povos Indígenas, Interculturalidade e Educação (Nepiie) da Faculdade de Educação da Baixada Fluminense (Febf - Uerj), a presença indígena nas universidades é fundamental para uma diversidade étnica, cultural e linguística. Segundo Russo, o país poderia aprender com intelectuais indígenas novos saberes e perspectivas teóricas nos mais diversos campos de estudo, como filosofia, agronomia e ciência, por exemplo.


Coletivo dos Estudantes Indígenas na UFF


Diante desse cenário hostil e pouco acolhedor, os coletivos indígenas aparecem como principal forma de união entre os estudantes nas universidades. Juliana Gomes conta que, antes mesmo de participar da criação do coletivo, já tinha essa ideia em mente, mas faltavam outros alunos indígenas na UFF. Ao conhecer uma outra estudante, o coletivo, então, aos poucos, foi criado. Hoje, o coletivo conta com 15 participantes, mas dois não fazem curso na universidade.


Ela destaca que a ideia surgiu como um lugar de acolhimento para os alunos e uma oportunidade de estarem juntos a pessoas que entendem e compartilham de suas experiências: “Com o coletivo, a gente não se sente sozinha. Temos pessoas que entendem nossas experiências, nos acolhem, abraçam. Que fazem a gente resistir nesse espaço que muitas vezes é hostil a gente, mas também tem a importância de colocar nosso posicionamento político e nossas demandas. Ser um espaço de luta.”


Uma das principais pautas do coletivo é a luta pelo vestibular quilombola e indígena. Segundo Juliana, esse é um projeto em conjunto com outras universidades e busca construir um vestibular unificado para as faculdades federais do Rio de Janeiro, com o objetivo de que, quando o estudante for aprovado, ele possa escolher para qual universidade ir. Além disso, o coletivo luta por mudanças nas grades curriculares para inclusão de história indígena e a construção de um memorial indígena e quilombola.


Participantes do coletivo de estudantes indígenas na Uerj - Foto: Coletivo Yandé Iwí Mimbira

Os indígenas na Uerj


Tãngwa Matu Puri, estudante de História na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), é membro do coletivo Yandé Iwí Mimbira (“Nós, filhos da terra”, em língua Nheengatu). Assim como Juliana, ele também destaca o papel do coletivo como um lugar de acolhimento e luta por direitos dentro do ambiente acadêmico, mas ressalta: “Esse acolhimento é mais entre a gente do que por parte da própria faculdade. O coletivo é um movimento de resistência e existência indígenamente acadêmico, mas a universidade continua sendo predominantemente branca.” Segundo Tãngwa, o coletivo conta atualmente com cerca de 10 membros.


Para ele, a presença indígena nas universidades e nos mais diferentes lugares da sociedade é uma extensão da resistência e luta ao longo dos 500 anos, e acrescenta que esse movimento é importante para evitar que narrativas brancas sigam moldando a imagem dos indígenas e suas histórias.


Neste contexto, Kelly Russo, coordenadora do Nepiie, chama a atenção para a importância da mudança desse cenário: “Em todas as instâncias da sociedade, a presença indígena se faz mais necessária do que nunca para que a gente possa desenvolver políticas mais condizentes para a maior parte da população brasileira. Eu acho que isso é urgente.”




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