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Ana Beatriz Dias

Das margens ao centro: audiência do futebol feminino cresce 57% em 2023

Investimentos, apoio midiático e engajamento da torcida sinalizam um futuro promissor


Repórter: Ana Beatriz Dias

Editor: Bernardo Monteiro


A Copa do Mundo Feminina de 2023, transmitida pela segunda vez consecutiva em televisão aberta, bateu recordes de audiência e tornou-se um fenômeno nas redes sociais, solidificando o crescente interesse pelo futebol feminino. O torneio, que pela primeira vez contou com 32 seleções – igualando-se ao masculino – e apresentou o maior prêmio desde 1991, reflete uma era de maior visibilidade e patrocínio para o esporte praticado pelas mulheres.

Foto: Getty Images

Na edição de 2019, o mundial teve 12 patrocinadores. Em 2023, o número aumentou para 30. A audiência do público e o apoio da imprensa permitem que as mulheres tenham possibilidades de crescer no esporte. O Brasil, país do futebol, tem seu sucesso na modalidade resumido às conquistas apenas da seleção masculina. Isso se deve ao fato de que, no século XX, as mulheres foram proibidas de jogar futebol através de um decreto-lei e sofrem consequências até os dias de hoje.


Decreto-lei que proibiu as mulheres de jogarem futebol

Decreto-lei nº 3.199, de 14 de abril de 1941 - Foto: Reprodução/Museu do Futebol

Em 1941, o decreto-lei assinado por Getúlio Vargas proibiu a prática do futebol feminino no país. As mulheres resistiram e começaram a praticar o esporte clandestinamente nas várzeas e periferias, onde o Estado não chegava. O impedimento foi revogado em 1979, contudo, elas só tiveram oportunidades de jogar em 1983, quando o esporte feminino foi regularizado.


Em razão dessa proibição, as oportunidades por melhores condições de vida foram excluídas por quatro décadas. A respeito do que falta para que as mulheres consigam ter seus méritos reconhecidos, Leda Costa, pesquisadora do Laboratório de Estudos em Mídia e Esporte (Leme) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), afirmou que sente necessidade de uma espécie de reparação. Ou seja, clubes e federações precisam tomar atitudes a favor dos 42 anos “perdidos”, a fim de que eles não sejam esquecidos por parte da sociedade, mas sim questionados.


Na perspectiva da pesquisadora, a televisão, como “grande mídia”, tem a função de denunciar o que foi feito contra as mulheres, visto que o decreto-lei criou uma lacuna no investimento e na infraestrutura. “O futebol masculino se desenvolveu plenamente na Copa do Mundo, nos jogos olímpicos e nos torneios regionais. Eram todos bem estruturados dentro de uma dinâmica de esporte profissional e se construindo enquanto tal. Com o passar do tempo, os homens se consolidaram e foram crescendo, mas o feminino ficou esquecido, pelo referente à prática legalizada. Houve resistência, em nenhum momento as mulheres deixaram de jogar. Como era proibido, elas sofreram ameaças e correram riscos de serem presas.”


A forte reivindicação a favor do fim da proibição do futebol feminino no final da década de 1970 fez com que as mulheres voltassem a praticar o esporte legalmente. No entanto, como a pesquisadora disse, prejuízos ainda são encontrados. “O esporte profissional das mulheres não teve êxito, tampouco nas categorias de base. O reconhecimento delas vêm por ações que se pautam na necessidade de reparar o tempo em que elas foram impedidas não só de participar de um espaço importante no Brasil, mas também do mercado de trabalho, que é o âmbito do futebol.”


Futebol feminino na televisão aberta


Ainda que a mídia não alcance diversas localidades no Brasil e no mundo (visto que nem todos têm acesso), ela contribui com uma grande parcela de importância no futebol. Para Leda, é fundamental que a principal emissora de televisão aberta do país divulgue campeonatos como a Copa do Mundo e o Brasileirão Feminino. “A Globo é um dos maiores veículos de comunicação. Ter comprado o direito de transmissão das partidas do mundial me parece bastante significativo, porque existe a tentativa de investimento que pode se relacionar com as novas pautas inclusivas, que são muito fortes no ambiente futebolístico atual.”


A pesquisadora observou que as últimas edições de Copa do Mundo têm apresentado um número significativo de público nos estádios, e que, por ser o maior evento futebolístico, é necessário que todos tenham acesso às partidas. Em relação ao Brasileirão, pontuou: “É preciso existir igualdade na divulgação entre os homens e as mulheres. O masculino sempre foi transmitido, logo, o delas também precisa ser. Hoje em dia o público é maior, as pessoas têm acompanhado mais. Por esse motivo, as emissoras televisivas têm a necessidade de acompanhar as mudanças, tanto na sociedade, quanto no futebol.”


Apoio e interesse dos torcedores no esporte


No Brasileirão 2023, principalmente nas partidas dos times de São Paulo, onde a infraestrutura é maior, a média de público foi considerada alta comparada às edições anteriores. Na final, quando o Corinthians sagrou-se pentacampeão contra a Ferroviária, 42.556 torcedores estiveram presentes na Neo Química Arena e bateram o recorde de público da modalidade, no recorte dos clubes sul-americanos.


Para Anne Moraes, membro de torcida organizada do Corinthians, o aumento da visibilidade do futebol feminino se dá justamente pela melhoria dos clubes e do esporte. “É muito mais fácil querer ir em um estádio onde a infraestrutura é boa. Fiquei feliz em ver o tanto de gente que estava lá para prestigiar as meninas. Isso conta demais, quanto mais apoio, mais visibilidade o futebol feminino terá. As pessoas têm se mostrado cada vez mais interessadas, a final na TV aberta é uma conquista não só para elas, mas para todas nós.”


Final entre Corinthians x Ferroviária, no dia 10/9/23, na Neo Química Arena - Foto: Chris Mattos

Patrocínios das empresas na competição mundial


Desde a edição de 2019, a Copa do Mundo tem conquistado evolução na visibilidade e na audiência. À medida que a popularidade do esporte tem crescido em todo o mundo, marcas e empresas têm investido no mercado. Gabriela Brito, torcedora do Flamengo, percebeu a diferença no número de patrocínios na modalidade e comemorou que as mulheres estão recebendo a atenção que foi negligenciada por décadas.


Gabriela pontuou que, nas Copas anteriores, era difícil ver grandes patrocínios, principalmente porque nas primeiras edições o torneio foi ignorado. A expectativa da torcedora é que o futebol feminino continue crescendo e que atraia a atenção das marcas cada vez mais. “O interesse era pequeno, não se importavam com o trabalho delas. Agora, é possível ver o aumento da audiência e do investimento. Hoje em dia, as empresas possuem interesses, isso é importante porque traz recursos e melhorias para elas.”


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