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  • Rafael Lopes

Corrida desigual: ingresso mais barato para Interlagos custa um terço do salário mínimo

Cada vez mais popular no país, Fórmula 1 propõe experiência excludente aos fãs brasileiros


Repórter: Rafael Lopes

Editor: Eduardo Dias


GP de Interlagos em 2021 - Foto: Beto Issa

Na manhã de domingo (5), a fã de automobilismo Maria Clara Araújo esperava na fila para acompanhar seu primeiro Grande Prêmio da Fórmula 1. Debaixo do escaldante sol de Interlagos, a jovem escuta dois meninos que estavam vendendo água se questionarem: "Será que algum dia nós vamos assistir alguma corrida?" Nos últimos anos, o automobilismo tem ganhado fãs no Brasil. Porém, o aumento de popularidade no país é acompanhado de uma política de preços excludente.


Os valores divulgados pela Federação Internacional de Automobilismo (FIA) para o próximo GP de Interlagos, marcado para 2024, são exorbitantes: a meia-entrada mais barata custa R$425, quase um terço dos R$1320 do salário mínimo do país. Comparado com 2023, o valor de um assento no Setor G, o mais barato, aumentou 7,6%. 


A alta no preço dos ingressos não é novidade nos esportes do país. No futebol, por exemplo, o ticket médio para a Final da Copa do Brasil de 2023 custou R$391. O cenário vai de encontro ao fenômeno da popularização da Fórmula 1 no Brasil. Segundo pesquisa do IBOPE, 52 milhões de brasileiros se declaram fãs de automobilismo. 


Acompanhar um Grande Prêmio ao vivo é um lazer destinado a poucos. Além do ingresso, há a despesa com a consumação de comidas e bebidas. Araújo relata que, em sua primeira vez em Interlagos, se assustou com os R$50 cobrados por um hambúrguer simples. A universitária ressalta que a desigualdade social da área é notória: "Nos arredores do evento você vê muitos moradores de rua. Quando estava saindo do hotel, minha família deu uma pipoca para uma pessoa com fome e ela sorriu como se nunca tivesse passado por isso." 


Aumento da popularidade impulsiona elevação dos preços


Jornalista especializada em Fórmula 1, Maria Clara Castro explica que a recorrente alta no preço dos ingressos se explica, justamente, pelo aumento do público: "A Fórmula 1 se popularizou nos últimos anos, seja pela série na Netflix ou pelo Tik-tok. O motivo é o aumento dessa demanda de ingressos. Hoje em dia, o número de pessoas que querem estar em Interlagos é bem maior." Ela finaliza dizendo que a lógica, apesar de compreensível, é totalmente questionável e caminha contra a democratização do esporte. 


Durante a temporada da Fórmula 1, os pilotos percorrem os mais ricos e luxuosos territórios do mundo, como Mônaco e Emirados Árabes Unidos. Brasil e México compõem o calendário como os únicos representantes da América Latina, mas que também têm outra característica em comum: ambos são países marcados pela desigualdade social. Castro destaca que um passo inicial para a mudança seria um posicionamento da organização de automobilismo brasileira: "Como a organização internacional não compreende a realidade desigual do Brasil, é preciso externá-la. Quem sabe esse passo inicial não resulta em políticas democráticas?" 


Por enquanto, a realidade segue desigual nos autódromos do Brasil. Apesar do aumento no público, seus produtos são amplamente direcionados à parcela rica da sociedade. A publicitária carioca Nathália Castro faz parte da parcela que passou a acompanhar a modalidade recentemente e detalha um sentimento dúbio em relação à fase do esporte no Brasil: "Me sinto feliz por ver mais pessoas que se interessam pela Fórmula 1, mas reconheço que é triste ver uma política de preços tão excludente. Eu ainda não consegui assistir o meu primeiro GP ao vivo."


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