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  • Leonardo Siqueira

Artistas negros lutam por espaço e reconhecimento no Brasil

Levantamento aponta que apenas 9% dos trabalhadores empregados na área da cultura são negros


Repórter: Leonardo Siqueira

Editor: Bernardo Monteiro


Exposição do artista Mulambö sobre o Vinícius Júnior, em Barcelona - Foto: Ana Bia Silva

Segundo levantamento do Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural sobre a indústria criativa, referente ao primeiro trimestre de 2023, os trabalhadores negros representam 9% dos empregados no setor da cultura, enquanto brancos e pardos correspondem, respectivamente, a 57% e 33% do total. Para os artistas Guilherme da Costa e Mulambö, a avaliação é a mesma: a maior valorização dos artistas negros do país hoje é fruto de lutas da própria população negra, e, apesar do progresso, o cenário ainda está longe do ideal.


Um exemplo notório acerca desse espaço e reconhecimento é a trajetória de Cartola, cantor e compositor que completaria 115 anos no dia 11 de outubro. Reconhecido como um dos maiores nomes do samba e da música no Brasil, Cartola não recebeu em vida a glória que merecia: morreu pobre em 1980, época em que vivia em um sobrado doado pela Prefeitura.


A experiência de quem conhece a realidade


Guilherme da Costa, poeta e beatmaker, afirma observar melhorias relacionadas ao trabalho artístico e cultural no país, especialmente decorrentes de movimentações e reivindicações de quem vivencia essa realidade. No entanto, ele revela ainda ser muito difícil viver da arte no Brasil: “A carreira do artista dá algumas pancadas, e você se vê obrigado a cogitar fazer outras coisas. Não dá pra você pensar, muitas vezes, em ser só artista, principalmente quando você é periférico e não tem muita grana para investir no seu trabalho.”


Da Costa ressalta que hoje há mais espaço para discussões raciais que dão mais destaques para artistas negros, mas acredita que o problema é estrutural da sociedade. Ele alega que ainda há uma diferença grande no cenário da arte entre um branco de classe média alta e um artista negro, pobre e periférico.


Guilherme da Costa em slam de poesia - Foto: Acervo Pessoal

De acordo com a pesquisa do Observatório Itaú Cultural, homens brancos empregados no setor cultural recebem, em média, R$ 6,7 mil. Já a faixa salarial dos homens negros equivale a mesma média das mulheres brancas: R$ 4 mil por mês. As mulheres negras, por outro lado, ganham uma média salarial de R$ 2,1 mil.


Para Adair Rocha, diretor do Departamento Cultural da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), a própria existência de favelas é uma expressão racista, e arte aparece como um dos principais mecanismos de combate ao racismo: “Ela atrai cada vez mais as pessoas não só pela beleza da construção, mas pelo seu recado”, declara. O diretor destaca a cultura como uma expressão que possibilita ao artista cada vez mais ser ele mesmo e posicionar seu lugar na história.

Diferente de Guilherme da Costa, o trabalho do artista Mulambö é mais voltado para as artes visuais, especialmente pinturas e esculturas. Em seu trabalho “Punta de Lanza” (Ponta de lança, em espanhol), realizou uma exposição, em Barcelona, que debatia os casos de racismo sofridos pelo brasileiro Vinícius Jr. na Espanha.


Hoje com trabalhos mais desenvolvidos, o artista relembra dificuldades no início da carreira. Ele aponta que os obstáculos vão além para falta de oportunidades, pois não há no Brasil uma cultura de proximidade com a arte, o que fez com que se sentisse perdido: “É uma falta de referência. Eu pensava: ‘Vou ser artista. E o que é isso? Se eu for artista e der tudo certo, o que acontece?’ Eu não tinha essa possibilidade de sonhar”, revela.


Mulambö acredita que há uma maior valorização dos artistas negros no país, e, hoje, ocupam mais espaços e têm suas vozes mais ouvidas pela sociedade. Para ele, esse crescimento é resultado de lutas e batalhas por espaço de muitas pessoas, tanto da atualidade quanto de gerações passadas, e cita exemplos como de Cartola, que passou a vida sem receber seu devido valor, mas que inspirou outros artistas a seguir nessa luta por oportunidades e reconhecimento. No entanto, Mulabö ressalta que a mudança é recente e que ainda há muito a evoluir.


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